IOF vira gambiarra fiscal chancelada pelo STF na tentativa de salvar um ajuste fiscal que nunca veio
A decisão do ministro do Supremo, Alexandre de Moraes, de manter o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) não parece ter eliminado a questão central dos conflitos entre Congresso e o governo.
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A decisão do ministro Alexandre de Moraes limitou-se a retirar do pacote do IOF a tributação que incidiria sobre o crédito denominado “risco sacado”, que é uma operação comum no comércio, em que o fornecedor recebe à vista do banco pela mercadoria vendida no atacado, e o comerciante assume a dívida a prazo com o banco.
Mais de uma vez, o próprio ministro, na condição de árbitro do conflito entre os outros dois poderes, afirmou que a questão central estava no uso indevido de um imposto regulatório, como é o caso do IOF, para fins escancaradamente arrecadatórios.
A razão pela qual o governo optou pelo IOF para aumentar a arrecadação tem a ver com a exigência do princípio da anualidade – o que determina que um imposto destinado a aumentar a arrecadação só entre em vigor no exercício fiscal seguinte ao da aprovação da lei. Essa exigência não se estende aos impostos regulatórios, porque eles têm de entrar imediatamente em vigor.
Depois que o Congresso rejeitou a medida provisória que instituiu o pacote, o governo recorreu ao Supremo na tentativa de reverter a decisão legislativa. Uma coisa é judicializar decisões para defender prerrogativas constitucionais, quando existem. Outra, bem diferente, é escavar narrativas contraditórias para impor o descabido.
Ao tentar justificar o injustificável, a equipe econômica trata os contribuintes e a opinião pública como idiotas.
Ao longo de semanas, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu a medida provisória do IOF como necessária para cobrir, em grande parte, o rombo fiscal que o governo se recusa a enfrentar por meio da redução de despesas. Definia, portanto, sua natureza tributária.
Em 2023, durante a apresentação do arcabouço fiscal, o ministro Haddad jurou que não aumentaria a carga tributária para cumprir metas fiscais.
o de tributo regulatório gera impasse entre Executivo, Legislativo e Judiciário. Foto: Wilton Junior/ Estadao
Na batalha perdida para o Congresso, o governo Lula passou a acusar os lobbies dos ricos de empurrar para a população mais pobre o custo do saneamento fiscal, na base do “nós contra eles”. Ou seja, passou a defender o pacote como política de justiça tributária. É argumento sem pé nem cabeça porque, além de encarecer o custo do crédito para as camadas de renda mais baixa, passou a conta para os microempreendedores individuais, para as pequenas e médias empresas que usam o Simples para saldar suas obrigações com o Fisco.
Quando percebeu que estava em jogo o uso inapropriado de um tributo, a equipe econômica, principalmente o secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan, inventou a narrativa de que o principal objetivo do pacote era mesmo regulatório e que o aumento da arrecadação não passava de efeito colateral.
Não é preciso ir muito longe para explicar por que um imposto regulatório não pode ser usado para fins arrecadatórios. É que esse desvio tira força do imposto quando ele terá de ser usado depois para fins regulatórios. Como o ministro não tratou da questão que ele próprio havia julgado central, a matéria parece sujeita a novos questionamentos na Justiça.
Fonte: Estadão