Governo quer mais transparência para CDBs vendidos por bancos após crise do Master

Proposta visa também endurecer a regulação dos ativos comprados pelos bancos por meio dos recursos captados no mercado com a oferta desses papeis

Adriana Fernandes

Brasília

Integrantes da área econômica do governo querem aumentar a transparência para CDBs (Certificados de Depósitos Bancários) e endurecer a regulação dos ativos comprados pelos bancos por meio dos recursos captados com a oferta dessas aplicações financeiras. A definição das novas regras deve ocorrer após a decisão sobre o futuro do banco Master pelo Banco Central.

A avaliação é que é preciso ampliar a saúde do sistema bancário brasileiro com regras que garantam maior qualidade para os ativos que estão sendo adquiridos pelas instituições financeiras com recursos obtidos com a garantia do FGC (Fundo Garantidor de Crédito), segundo pessoas a par do tema ouvidas pela Folha.

O fundo, que cobre depósitos e aplicações de até R$ 250 mil em caso de quebra da instituição financeira, entrou em discussão após proposta de compra pelo BRB (Banco de Brasília) de fatia do Banco Master chamada de “good bank”. Nesse bloco estão CDBs que eram vendidos pelo Master com promessa de alta remuneração e usando, como marketing, a proteção oferecida pelo fundo.

Hoje, o FGC é o maior credor do Master porque garante cerca de R$ 54 bilhões de CDBs emitidos pelo banco –metade do patrimônio líquido do fundo.

O FGC está também no centro das negociações envolvendo o destino da parte do Banco Master que tem sido chamada de “bad bank” (banco ruim), e engloba ativos de maior risco, como precatórios.

A emissão e venda de CDBs está sujeita à regulação do Banco Central. Os bancos não precisam hoje passar informações aos investidores, se restringindo a publicar as demonstrações financeiras. Um integrante do governo disse à reportagem, na condição de anonimato, que é preciso fazer uma “limpeza” nas regras para rever o sistema. Para os CDBs, uma das ideias é adotar um modelo de transparência semelhante ao que existe, por exemplo, para fundos de investimentos.

Regras da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) exigem a transferência de informações pelos gestores dos fundos para que o investidor faça a sua análise e decida se ele está disposto ou não a tomar aquele risco.

A resolução 179 da CVM, conhecida como “resolução da transparência”, determina que os assessores de investimento, que ofertam ativos financeiros como fundos de investimento, ações e debêntures, informem seus clientes sobre a remuneração recebida pela oferta desses ativos, incluindo comissões, taxas e outros incentivos, e sobre potenciais conflitos de interesse.

Os investidores devem ainda ter acesso a informações detalhadas sobre os custos envolvidos nas operações, como taxas e custos de captação, no momento da transação. A resolução visa garantir que o investidor esteja ciente de todas as remunerações e encargos envolvidos.

Um técnico envolvido nas discussões afirmaque é preciso informar o risco e também, por exemplo, o tempo que levaria para o FGC cobrir o seguro do CDB em caso de insolvência da instituição financeira que vendeu o instrumento financeiro.

Segundo ele, há uma percepção errônea entre investidores menos informados de que o pagamento é feito em curto prazo. Não há prazo fixo. O tempo médio das últimas liquidações foi de um mês. Mas pode demorar mais, porque depende do liquidante do banco que quebrou. O fundo paga dois dias depois que recebe a lista de credores preparada e enviada pelo liquidante.

Entre as regras mais duras que podem ser adotadas em relação aos ativos que podem ser comprados com os recursos captados por meio de CDBs está uma exigência maior de capital das instituições financeiras para determinadas classes de ativos ou mesmo proibir a compra de alguns tipos deles.

Há o entendimento de que o Banco Central tem bastante espaço de regulação para fazer correções de rota, mas com cautela para não estressar a indústria bancária e de olho num horizonte mais longo para implementação na busca de garantir a perenidade do mecanismo de proteção.

Um executivo do mercado que participa das negociações para a saída do Master avalia que é preciso aproveitar o momento e enfrentar o desafio para aprimorar as regras prudenciais para torná-las mais rigorosas, acompanhando as transformações do mercado. Esse executivo destaca que isso precisa ocorrer sem que o BC “dê um cavalo de pau” na regulação bancária. Participantes do FGC avaliam como positivas eventuais mudanças.

Parte das medidas em estudo pode ser adotada pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) e resolução do Banco Central. O governo também quer aproveitar a discussão para aprovar o projeto de lei complementar nº 281, de 2019, em tramitação no Congresso Nacional, que trata do aperfeiçoamento da legislação para lidar com a insolvência de bancos e outras instituições financeiras, minimizando o risco sistêmico que pode afetar o sistema financeiro como um todo. A proposta define os regimes para lidar com instituições financeiras em dificuldades.

As medidas regulatórias visam evitar o que aconteceu com o Master. Com o dinheiro captado pelos CDBs, o banco de Daniel Vorcaro comprava ativos mais arriscados, que não têm liquidez para bancar todos vencimentos dos CDBs. O “bad bank” do Master conta com os ativos de maior risco e ilíquidos, como precatórios, pré-precatórios e direitos creditórios de ações judiciais, além de ações de empresas. As negociações em curso caminham na direção de uma solução que envolva uma liquidação privada com aporte do FGC.


Fonte: Folha de São Paulo

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