STF encerra 1º dia de julgamento com defesas de Cid, Ramagem, Garnier e Torres

Corte retoma sessão nesta quarta-feira com as defesas de Augusto Heleno, Bolsonaro, Nogueira e Braga Netto

Carolina Ingizza, Mirielle Carvalho

O Supremo Tribunal Federal (STF) encerrou nesta terça-feira (2/9) o primeiro dia de julgamento da Ação Penal 2.668, que apura a responsabilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outros sete réus na tentativa de golpe em 2022.

A sessão começou às 9h, com a leitura do relatório pelo ministro Alexandre de Moraes, seguida pela manifestação do procurador-geral da República (PGR), Paulo Gonet, que destacou a atuação coordenada do “núcleo crucial” na tentativa de golpe.

No período da tarde, começaram as sustentações orais das defesas. Falaram os advogados de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência; Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin e hoje deputado federal; Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; e Anderson Torres, ex-ministro da Justiça.

O julgamento será retomado nesta quarta-feira (3/9), quando apresentarão suas sustentações as defesas do general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional; de Jair Bolsonaro, ex-presidente da República; de Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; e de Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil.

Defesa reafirma validade da colaboração de Cid

O advogado Jair Alves Pereira, que representa Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, foi o primeiro a falar. Ele afirmou que não houve qualquer coação por parte da Polícia Federal ou do ministro Alexandre de Moraes durante a colaboração premiada. Segundo Pereira, a delação de Cid foi validada em diversas oportunidades pela Corte e se mantém como peça central para a dinâmica dos fatos investigados na tentativa de golpe de 2022.

O advogado pediu que o acordo seja mantido com todos os benefícios previstos, sob o argumento de que uma condenação após a delação esvaziaria o instituto da colaboração premiada. “Se a colaboração premiada dele é sólida, e é, e foi reiterada inúmeras vezes, por que ele não teria os benefícios que ajustou?”, questionou.

Após Jair Alves focar na delação, o outro advogado do réu, Cézar Bitencourt, defendeu a inocência de Cid. Ele afirmou que o ex-ajudante de ordens cumpria o que lhe era pedido e ele não participou de qualquer ato golpista de forma dolosa. “Não há uma fala real de Cid para subverter o regime”, afirmou.

Ramagem não é ‘ensaísta’ de Bolsonaro

Em seguida, a defesa do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) alegou que os documentos citados pela acusação eram apenas anotações pessoais e não chegaram a ser entregues ao ex-presidente Jair Bolsonaro. O advogado Paulo Renato Cintra afirmou que Ramagem não atuou como “ensaísta” de Bolsonaro, mas apenas reuniu declarações já públicas do então presidente.

Ele negou ainda que o deputado tenha usado a Abin para monitorar autoridades, disse que o grupo de trabalho sobre urnas eletrônicas “não saiu do papel” e pediu a suspensão da acusação por organização criminosa, sob o argumento de que os supostos crimes ocorreram após a diplomação do parlamentar.

Defesa do almirante Garnier

A defesa do almirante Almir Garnier Santos, feita pelo advogado Demóstenes Torres, questionou a validade da colaboração premiada de Cid. Torres pediu a rescisão do acordo, afirmando que a proposta de Gonet é “injurídica” e inexistente no ordenamento. Segundo ele, o próprio PGR descreveu Cid como “contraditório, desleal e omisso”, o que compromete sua credibilidade.

Torres também sustentou que a denúncia não individualiza condutas e foi construída a partir de uma “narrativa global”. Acrescentou que o PGR trouxe fatos novos nas alegações finais — como o desfile da Marinha em 2021 e a ausência de Garnier na passagem de comando em 2023 —, o que, na visão da defesa, viola o princípio da congruência do Código de Processo Penal.

Por fim, afirmou que não há provas de que Garnier tenha colocado tropas à disposição de Jair Bolsonaro em 7 de dezembro de 2022 e criticou a tentativa de criminalizar manifestações políticas. Para Torres, a tese de que a live de Bolsonaro teria sido um “marco simbólico” é incompatível com o direito penal moderno.

Ao final, pediu a absolvição do almirante, alegando que a narrativa sobre sua participação em atos golpistas é “inverossímil” e sem respaldo nos autos. Caso haja condenação, propôs alternativas jurídicas para que a pena seja reduzida, como a aplicação do princípio da consunção — evitando a dupla punição.

Advogado de Torres fala em ‘ilações’ do MPF

A defesa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, feita pelo advogado Eumar Roberto Novacki, alegou que a peça acusatória apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) está recheada de “ilações e afirmações sem provas”. Além disso, a defesa de Torres chamou a acusação de “ponto fora da curva”.

Novacki também criticou as alegações da PGR de que o ex-secretário de Segurança Pública do DF teria forjado passagens de avião de uma viagem aos EUA nos dias que antecederam os atos de 8 de janeiro.

“Agora, veja só: essas passagens foram juntadas no processo em 2023. O MPF passa todo esse tempo sem fazer um questionamento sequer e, na sua última manifestação formal, ainda trouxe uma ameaça de abrir procedimento investigatório para apurar a possível fraude”, disse o advogado do ex-ministro da Justiça.

Ainda segundo a defesa, a PRF e o Ministério Público Federal não estavam interessados na “verdade” sobre a ausência do ex-secretário de Segurança Pública do DF na ocasião. “Toda a narrativa do MP em relação a Torres parte da premissa de que ele teria conspirado, participado de uma macabra trama golpista, deliberadamente se ausentado do DF. Mas isso não caminha com a verdade”, afirmou o advogado. A defesa de Torres também apontou que, no mérito, a acusação da PGR sustenta, ainda que sem provas, cinco condutas de Anderson Torres: a participação em uma live, a reunião ministerial, o suposto uso indevido da PRF, um assessoramento jurídico ao ex-presidente da República. Em relação à live, Novacki disse que ficou comprovado que o ex-ministro da Justiça foi convocado pelo então presidente da República Jair Bolsonaro.


Fonte: JOTA

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