PEC que muda regra dos precatórios significa calote e desmoralização das regras fiscais
A PEC n.º 66/2023, que altera as regras sobre pagamento de precatórios, foi aprovada pela Câmara dos Deputados em 15 de julho e encontra-se em fase final de tramitação no Senado Federal. A proposta deve ser aprovada, em segundo turno, com facilidade, contando com apoio da base aliada do governo e da oposição.
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De forma resumida, a PEC abre espaço para substanciais aumentos de despesas não só na União, mas também nos demais entes federativos. Além disso, no caso dos Estados e municípios, institucionaliza o calote nos precatórios. E, como sempre, medidas dessa natureza conseguem unir partidos de todas as tendências ideológicas.
A norma atual para a União cita que fica fora do limite de despesas e não é computado para a meta de resultado primário, o valor dos precatórios que ultrapasse o montante pago em 2016 atualizado pela variação acumulada do IPCA. A PEC estabelece que em 2026 o valor total dos precatórios, estimado em mais de R$ 70 bilhões, não se sujeitará às restrições das regras fiscais. A incorporação ocorrerá muito lentamente, a partir de 2027, à razão de 1/10 do valor pago ao ano. É mais um arranhão na credibilidade do arcabouço fiscal como instrumento de controle do endividamento público.
Na verdade, precatórios já são dívida pública porque são emitidos após o trânsito em julgado do litígio, e portanto, fazem parte do passivo da União desde sua emissão, embora o mercado financeiro pareça não se dar conta disso. A questão aqui é que, com a nova regra, será aberto mais espaço para gastos primários da União e aumento da dívida mobiliária, sem que os gatilhos de contenção de despesas sejam acionados.
No caso dos Estados e municípios, a PEC institucionaliza a inadimplência. As novas regras estabelecem limites de 1% a 5% da receita corrente líquida que deve ser utilizada para o pagamento de precatórios. Esses limites dependem da relação entre o estoque de precatórios a pagar e a receita corrente líquida. Quanto maior for essa relação, maior será o porcentual da receita corrente líquida que deverá ser utilizado para o pagamento desse passivo, mas o teto é de 5%. O valor que superar tais limites fica com data de liquidação indefinida. Ou seja, é uma postergação unilateral da data de vencimento da dívida por parte do devedor, o que cria grande imprevisibilidade para os credores.
Tal imprevisibilidade aumenta a percepção de risco por parte do setor privado ao negociar com o setor público. Isso se transforma em maiores custos para aquisição de bens e serviços nas compras governamentais e juros mais altos para o financiamento dos gastos públicos. Em última análise, o ônus recairá sobre os contribuintes. Finalmente, como no caso da flexibilização do arcabouço para a União, as regras que limitam o pagamento de precatórios nos Estados e municípios abrem espaço para o aumento de gastos.
Fonte: Estadão