Os sinais de incômodo do STF com a chantagem de Trump
Desde o início da semana, STF começou a responder de forma mais direta às investidas do presidente americano contra a soberania nacional
Desde o início da semana, o Supremo Tribunal Federal (STF) começou a responder de forma mais direta às investidas do presidente americano Donald Trump contra o Judiciário e a soberania brasileira, dando sinais de que o Tribunal não aceitaria as ameaças sem reagir – da carta do presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, à decisão do ministro Alexandre de Moraes de colocar uma tornozeleira eletrônica no ex-presidente Jair Bolsonaro, passando pelo conteúdo dos votos para validar as medidas tomadas por Moraes.
Logo no início da semana, o presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, se manifestou – cinco dias depois do ataque mais direto à nação brasileira, quando Trump ameaçou o Brasil com tarifas de 50% e disse na carta ao presidente Lula que há uma “caça às bruxas” contra o ex-presidente Bolsonaro, que precisa se encerrar “imediatamente”.
Até a carta, o presidente do STF vinha deixando o assunto Trump, autoridades americanas e Brasil nas mãos da diplomacia brasileira – até porque não há muito o que ser feito do ponto de vista institucional pelo Supremo. Passado o calor dos fatos e do governo brasileiro conduzir as políticas imediatas, o STF resolveu passar a sua mensagem.
No texto, sem citar nomes, Barroso afirmou que a democracia é um espaço plural, mas não dá direito de torcer a verdade ou negar fatos concretos. Ele fez um histórico dos golpes e tentativas que o Brasil sofreu e lembrou que no caso da tentativa de golpe em 2022 “foi necessário um tribunal independente e atuante para evitar o colapso das instituições, como ocorreu em vários países do mundo, do Leste Europeu à América Latina”.
O presidente defendeu a condução das ações penais sobre a trama golpista na Corte e a decisão sobre o Marco Civil da Internet, que ampliou a responsabilidade das plataformas digitais sobre as publicações de seus usuários. Disse ainda que a decisão sobre as plataformas foi mais amena do que o aplicado na Europa, por exemplo. A decisão do Marco Civil também seria um dos pontos de crise entre o Brasil e Estados Unidos por estar prejudicando a livre atuação das big techs, a maioria, de origem norte-americana.
Moraes se manifestou sobre a crise na decisão que levou Bolsonaro a usar uma tornozeleira eletrônica por eventual fuga. Com uma investigação em curso, o ministro não moderou o tom e ressaltou que as ações de Jair Bolsonaro e seu filho Eduardo demonstram que o réu está atuando “dolosa e conscientemente de forma ilícita” com a finalidade de tentar submeter o funcionamento do Supremo ao crivo de outro Estado estrangeiro, “por meio de atos hostis derivados de negociações espúrias e criminosas com patente obstrução à Justiça e clara finalidade de coagir essa Corte no julgamento da AP 2.668/DF [sobre a tentativa de golpe no Brasil]”.
No voto do ministro Flávio Dino no referendo para validar as medidas tomadas por Moraes, o magistrado chama as deliberações de Trump de coação inédita ao tentar o “sequestro” da economia de uma nação, “ameaçando empresas e empregos, visando exigir que o Supremo pague o ‘resgate’, arquivando um processo judicial instaurado a pedido da Procuradoria-Geral da República, sob a regência exclusiva das leis brasileiras”.
Dino comenta que o modo de operação de Trump é incomum e lembra que o “Direito Constitucional Comparado registra intervenções armadas contra Tribunais cassações de magistrados, “court packing plan”, dissolução política de Cortes”, mas esse “sequestro” econômico tem “caráter absolutamente esdrúxulo”.
A ministra Cármen Lúcia validou as medidas de Moraes e afirmou que elas são necessárias “em benefício da segurança pública e jurídica e da sociedade, a fim de se guardar a Constituição do Brasil e se garantir o Estado de Direito”. Embora o Supremo não tenha dado a resposta no calor do fato, desde o começo da semana os movimentos demonstraram que o Supremo não iria se curvar a chantagens e agiria com medidas rígidas, à altura do perigo de expor o Brasil a uma intervenção em sua soberania.
Fonte: JOTA