Congresso derruba aumento do IOF; Lula deve se reunir com Motta e Alcolumbre e estuda ir ao STF

BRASÍLIA – O governo sofreu nesta quarta-feira, 25, uma derrota fragorosa no Congresso com a derrubada do decreto que aumentava o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e agora avalia entrar com ação no Supremo Tribunal Federal (STF).

Antes mesmo do fim da votação na Câmara, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu com os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), Rui Costa (Casa Civil) e com os líderes do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), e no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), no Palácio do Planalto.

A equipe econômica argumenta que a decisão do Congresso é inconstitucional e por isso quer recorrer ao STF. A ala política do governo tem dúvidas por temer que a medida acirre ainda mais os ânimos no Congresso.

Lula quer se reunir com os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), antes de tomar uma decisão sobre os próximos passos.

É a primeira vez em 33 anos que o Congresso derruba um decreto presidencial. O último presidente que teve um decreto derrubado pelo Congresso foi Fernando Collor, em 1992, seis meses antes da abertura do processo de impeachment.

“Foi, sim, uma derrota para o governo, mas essa derrota foi construída a várias mãos”, disse Alcolumbre. “É hora de pararmos e conversarmos mais.” O presidente do Senado afirmou, porém, que o Congresso mais ajuda do que atrapalha o governo. “O que fizemos nesses dois anos e meio, ajudando a agenda do governo, não deve ser reconhecido?”, perguntou.

Wagner disse não saber o que houve para Motta e Alcolumbre levarem o tema à votação, nesta quarta-feira.

A decisão de Motta de pôr em votação o projeto de decreto legislativo que derrubava a proposta do governo foi anunciada por ele nas redes sociais às 23h35 de terça-feira. Gleisi chegou a ligar para Guimarães, o líder do governo na Câmara, perguntando se ele sabia daquela decisão. Mas ele também ficou surpreso. “É evidente que agora vai ter contingenciamento de gastos”, afirmou Guimarães.

Esse decreto era fruto de um acordo e, de repente, o acordo não foi cumprido. Para mim, abre-se aqui um caminho perigoso”, completou Wagner.

A votação na Câmara foi acachapante: 383 votos a 98. No Senado, foi simbólica. Alcolumbre disse que colocaria a proposta em votação por um “compromisso político e institucional”.

Na Câmara, o texto foi votado após líderes serem pegos de surpresa com a decisão de Motta de pautar o PDL em uma sessão semipresencial, em meio a uma semana esvaziada no Congresso com o rescaldo das festas de São João.

Durante a votação, Motta rejeitou questões de ordem suscitadas pelo líder do PT na Casa, Lindbergh Farias (RJ). O presidente da Câmara sinalizou que as questões de ordem já estavam respondidas no parecer do relator, Coronel Chrisóstomo (PL-RO). Depois, a Casa discutiu um pedido do PT para adiar a votação por uma sessão, Foram 354 votos favoráveis à manutenção do item na pauta e 99 pelo adiamento.

Lindbergh ironizou a decisão de Motta de pautar o projeto.

“A gente fez campanha para o presidente Hugo Motta, sempre elogiamos a postura dele de não colocar nada no Plenário sem passar pelo colégio de líderes. Tomei um susto quando foi pautado o PDL. Não sei o que aconteceu ontem à noite”, disse, no Plenário, em meio à discussão sobre o mérito do PDL.

Lindbergh se disse “decepcionado” com o que acontece nesta quarta-feira na Câmara. Lembrou da reunião “histórica” entre Haddad, Gleisi e líderes da Câmara do Senado, sobre as medidas alternativas ao IOF e criticou Motta outra vez: “não entendi a mudança de posição no outro dia” — quando o presidente da Câmara disse que a Casa não tinha compromisso de aprovar as novas propostas do governo.

Segundo o líder, há “abutres de plantão” que querem “atrapalhar Lula” com a derrubada do IOF. Lindbergh repetiu que a derrubada do aumento do imposto significa um contingenciamento de R$ 12 bilhões, com cortes em programas sociais. “Não querem deixar as elites pagarem impostos”, afirmou. “Tem uns que acham que podem garrotear o presidente Lula. Estão tirando R$ 12 bilhões, mas vão quebrar a cara, porque isso demonstra o medo que eles tem de Lula”, disse.

Lindbergh ainda afirmou que, “se tem uma coisa que é a maior fake news”, é dizer que Lula e Haddad aumentam impostos. “Lula vai ser o presidente que mais vai reduzir imposto no Brasil para o povo trabalhador”, afirmou o deputado, em meio ao discurso em que destacou a força de lobbies organizados e criticou grandes empresários que defendem ajustes fiscais e estruturais “do alto de duas fortunas”.

O anúncio de que o PDL seria apreciado na Câmara foi feito por Motta no X no final da noite de terça, 24. O relator do projeto só foi designado nesta quarta: o escolhido foi visto por governistas como provocação.

Em seu parecer, o relator, Coronel Chrisóstomo, escreveu que “a cobrança de tributos pelo Estado, apesar de necessária à sua estruturação e prestação de serviços públicos dele demandados, representa uma forma de agressão ao patrimônio e à liberdade dos indivíduos”.

Na visão do parlamentar, os decretos do governo sobre o IOF buscaram “remediar os previsíveis reveses provenientes de um governo que evita a todo custo promover o ajuste fiscal por meio da contenção de gastos”.

Chrisóstomo afirmou ainda que o governo, apesar de classificar o aumento do IOF como medida “indispensável” para o alcance das metas orçamentárias, “se mostra pouco aguerrido ao combate aos obscuros benefícios fiscais e aos supersalários do funcionalismo”.

No Senado, governo dispensou votação nominal

O governo decidiu não pedir votação nominal — com registro individual dos votos dos senadores.

Contrário ao projeto, o líder do governo no Senado, Jaques Wagner, disse que o governo não tentaria atrasar a decisão. “Não vou pedir votação nominal”, disse Wagner, pouco antes da votação. Em seguida, o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), pediu que os senadores contrários à proposta declarassem voto contra no microfone.

A votação nominal é comumente usada para travar o andamento das votações. Ao fim, Alcolumbre afirmou que reconhecia o fato de que o governo concordou com a análise simbólica, mesmo sabendo que o resultado representaria uma derrota para o Palácio do Planalto.


Fonte: Estadão

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