Cade tem condições de expandir fiscalização sobre big techs, como quer a Fazenda; leia bastidor
BRASÍLIA – Integrantes do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) entendem que o órgão tem condições de expandir a fiscalização das grandes empresas de tecnologia no Brasil, conhecidas como big techs, conforme idealizado pelo Ministério da Fazenda.
Essa expansão da atuação do Cade depende da aprovação de um projeto de lei que amplie as competências do órgão, para que ele faça a regulação de mercados digitais. Segundo interlocutores ouvidos pela reportagem, caso o texto seja aprovado pelo Congresso, a autarquia tem todas as condições de assumir essa função e dar cabo a ela, ou seja, se adaptar às mudanças para “dar conta do recado”.
Em entrevista ao Estadão publicada nesta segunda-feira, 1º, o secretário de reformas microeconômicas, Marcos Barbosa Pinto, defendeu que a fiscalização das big techs em particular fique a cargo do Cade. Para tanto, a Superintendência-Geral do conselho poderá acumular esta nova atribuição ou poderá ser demandada a criação de uma superintendência específica para esse assunto.
“O que nós da Fazenda sugerimos é que houvesse, em qualquer caso, uma unidade especializada, porque a gente acha que o conhecimento técnico é muito importante”, argumentou o secretário Marcos Pinto.
Hoje, o Cade já detém competência para atuar sobre empresas de tecnologia, como detém para atuar em empresas de qualquer setor. O órgão tem dois grandes eixos de atuação: atos de concentração (nos casos de fusões e aquisições) e avaliações de condutas que configurem infrações à ordem econômica de maneira geral (cartéis e abusos de posição dominante).
Não há atualmente orientação estratégica no órgão para investigar mais casos de big techs. Além disso, o órgão não está imiscuído em análises de conteúdo que circulam nas plataformas.
Em contribuição à tomada de subsídios aberta pela Secretaria de Reformas Econômicas para regulação de plataformas digitais, em 2024, o gabinete da presidência do Cade sustentou que, dada a expertise e o histórico de atuação do órgão, ele seria “a autoridade mais adequada para assumir a responsabilidade ampliada caso seja decidido que não há necessidade de criar uma nova entidade reguladora”.
“A expertise já desenvolvida pelo Cade em lidar com questões concorrenciais complexas fornece uma base sólida para adaptar-se e expandir suas capacidades para abordar especificamente as nuances dos mercados digitais”, disse o documento, assinado pelo então presidente, Alexandre Cordeiro.
Foi defendido que, para tanto, a estrutura do Cade precisa ser expandida, com a criação de uma carreira específica focada na regulação econômica dos mercados digitais. Esse modelo segue a lógica de outras iniciativas internacionais, como a Digital Markets Unit (DMU) no Reino Unido, que opera dentro da autoridade antitruste e é especializada em questões relacionadas a mercados estratégicos digitais.
PL das big techs
No projeto de lei do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para regular as plataformas, apelidado de “PL das big techs”, a Fazenda propõe a criação de uma Superintendência de Mercados Digitais no âmbito do Cade.
Essa nova superintendência terá autonomia e poder regulatório para combater práticas anticompetitivas, como preferência por produtos próprios, acordos de exclusividade e aquisições de startups para eliminar concorrência. Entre suas atribuições estão exigir auditorias independentes e aplicar multas, o que permitirá ao Cade agir diretamente contra abusos no setor digital.
Como o órgão já avalia casos de abuso de posição dominante, o projeto ampliaria suas atribuições para que ele venha a fazer a regulação de mercados digitais, com uma regulação ex-ante (ou seja antes da ocorrência de algum evento) que seja capaz de prevenir e desde logo impor obrigações para proteção da concorrência em mercados digitais.
A competência para investigar casos, ressaltam integrantes do órgão, já existe e é feita. Agora, a ideia é seguir as diretrizes que União Europeia, Japão e Índia já vêm adotando no tocante à atuação das grandes empresas de tecnologia em seus territórios. No dia a dia das investigações feitas pelo Cade, estão casos como Wellhub x TotalPass, iFood e Apple, além de outros em andamento, como o caso do Google x Jornais e o da Microsoft x Opera.
Fonte: Estadão