IR: projeto para isentar quem ganha até R$ 5 mil começa a tramitar sob resistência em compensação

BRASÍLIA – O início dos trabalhos da comissão especial que vai analisar a proposta do governo Lula de isentar o Imposto de Renda de quem ganha até R$ 5 mil e reduzir a tributação até R$ 7 mil vai mostrar que há pontos que deixam Congresso e Executivo em lados opostos, principalmente no que diz respeito à compensação do benefício.

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A instalação da comissão está prevista para a tarde desta terça-feira, 6, com a participação de deputados indicados pelos partidos mais numerosos da Câmara. O relator será o deputado Arthur Lira (PP-AL), que já enviou um pedido de esclarecimentos com mais de 30 perguntas para o Ministério da Fazenda.

Lira quer saber como foram feitos os cálculos da Receita Federal que estimam uma renúncia esperada de R$ 25,84 bilhões no ano que vem e como é possível prever arrecadação de fontes alternativas, como a tributação adicional sobre quem ganha mais de R$ 50 mil mensais e sobre empresas que remetem lucros ao exterior. Só com este último fator, a Receita espera arrecadar R$ 8,9 bilhões a mais em 2026.

Um dos pontos que já provocam dúvidas e contrariedade entre parlamentares é a regra proposta para tributar dividendos. Pela fórmula elaborada pela Receita, os sócios de empresas cuja taxação seja inferior à alíquota padrão de 34% estarão sujeitos à tributação adicional, caso a sua alíquota efetiva de IR na pessoa física seja inferior a 10%.

Essa combinação da tributação da empresa com a da pessoa física tem sido tratada como uma mistura que não é bem-vinda entre os deputados. O próprio Lira já disse a interlocutores que preferia que as duas tributações fossem tratadas de maneira separada, e que a fórmula criada pela Receita Federal só gera mais complexidade para o contribuinte.

O Ministério da Fazenda informou, quando apresentou a proposta, que o objetivo de misturar a tributação da pessoa jurídica com a da pessoa física é evitar a dupla tributação, uma vez que um dos argumentos contrários à reforma do IR que as empresas já pagaram imposto e, por isso, os dividendos deveriam ser isentos.

Como mostrou o Estadão, há estudos que mostram que as empresas pagam menos imposto do que a alíquota padrão, o que faz com que nem as empresas nem os seus sócios sejam tributados. Segundo a Receita, isso permite que pessoas de alta renda acabem menos taxadas do que quem ganha menos.

Neste caso, o governo quer obrigá-los a recolher pelo menos 10% de IR, retendo imposto na fonte sobre o pagamento de dividendos que superarem R$ 50 mil mensais. É este recolhimento antecipado que deverá garantir a compensação pelo benefício aos contribuintes de renda inferior a R$ 7 mil já em 2026.

Governo tem pressa na aprovação da proposta

Os auxiliares de Lula afirmam que o presidente deseja apresentar o benefício como um dos feitos de seu governo durante eventual campanha pela reeleição no ano que vem.

Por isso, o governo tem pressa para que a mudança seja aprovada ainda em 2025 para que seja possível começar a aplicar a isenção em 2026. Para tanto, a medida de compensação, de geração de receita correspondente, tem de começar simultaneamente.

Mas Lira tem dito a colegas que esta fonte de compensação sobre contribuintes de alta renda não deve ser a única a ser levada para a mesa de negociação.

Um dos argumentos é que a tributação adicional sobre os que ganham entre R$ 50 mil e R$ 100 mil mensais não gera tanta arrecadação como se espera, e que o efeito maior no recolhimento de tributos ocorre apenas a partir deste patamar de renda. Ou seja, só para os que ganham mais do que R$ 100 mil por mês ou R$ 1,2 milhão por ano. Por isso, está sendo considerada a ideia de subir o início da tributação adicional para rendas acima de R$ 100 mil.

Lira tem defendido avaliar, também, a retirada de outras isenções, como a dedução de gastos com saúde e educação do IR, com o argumento de que são benefícios que atendem à alta renda. O assunto já foi alvo de debate no passado entre economistas, mas não avançou pela resistência da classe política.

Outro potencial alvo para gerar receitas é a taxação adicional dos bancos com a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), hoje em 21%. O presidente do PP, Ciro Nogueira (PI), propôs elevar a taxação em cinco pontos porcentuais para os bancos que lucrarem mais de R$ 1 bilhão por ano, ou seja, os maiores do País.

Esta ideia parece ter sido encampada pela cúpula da Câmara, uma vez que o presidente, Hugo Motta (Republicanos-PB), chegou a defender a proposta em entrevista nesta segunda-feira, 5.

No caso desta medida de compensação, Lira já foi informado de que, se for este o caminho escolhido, o projeto teria de ser aprovado ainda mais cedo, com sanção presidencial até o final de setembro, para começar a valer em janeiro de 2026 — seguindo as regras de noventena para aumento de impostos.

Estados e municípios participarão da discussão

Os deputados que vão integrar a comissão dizem, no entanto, não ter pressa na discussão, que envolverá também Estados e municípios. Lira já demonstrou preocupação com a perda de receita para os entes, uma vez que o produto do IR é repartido com governadores e prefeitos.

Segundo cálculos da consultoria de Orçamento da Câmara, Estados e municípios deverão perder R$ 2,9 bilhões com a proposta do governo. A arrecadação recuaria R$ 11,2 bilhões, porque o IR que incide sobre o salário de servidores de até R$ 7 mil hoje é receita própria dos entes federativos e deixaria de existir. No entanto, há previsão de aumento de repasses via fundos de participação de Estados e municípios em R$ 8,2 bilhões.


Fonte: Estadão

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