Corrupção e falta de políticas públicas são as principais causas da desigualdade no Brasil

A maioria da população, cerca de 77%, considera o Brasil “muito desigual”. A avaliação é mais forte entre mulheres, pessoas mais velhas e com menor escolaridade. É o que mostra pesquisa divulgada nesta terça-feira, 9, pela Fundação Itaú. As causa mais citadas pelos entrevistados são as políticas públicas e a má gestão governamental.

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Para 76% dos respondentes, a impunidade diante da corrupção aumenta as disparidades. Outros 70% avaliam que as leis de funcionamento da economia beneficia os mais ricos. Sobre este ponto, Alan Valadares, coordenador do Observatório Fundação Itaú, afirma que isso “evidencia uma insatisfação geral com a forma como o País está estruturado e a percepção de que diferentes grupos são impactados de maneira desigual”, avalia.

A 1ª edição da pesquisa “Percepções sobre as Desigualdades no Brasil”, realizada pelo Observatório Fundação Itaú em parceria com a Plano CDE e Datafolha, ouviu 2.787 pessoas de todas as regiões do País entre agosto e setembro de 2024, e em junho de 2025. O estudo buscou compreender como os brasileiros — a partir de recortes de gênero, raça e classe social — percebem as desigualdades no País, as origens e os impactos na vida. Além de identificar quais caminhos enxergam como prioritários para reduzir essas disparidades.

O estudo também revelou contradições entre a percepção das pessoas entrevistadas e a realidade. Alan Valadares indicou que, quando perguntadas espontaneamente, poucas pessoas citaram fatores históricos como causas da desigualdade.

Por exemplo, a influência da escravidão nas oportunidades das pessoas negras foi reconhecida por menos da metade da população, embora a maioria concorde que pessoas brancas têm mais acesso à educação de qualidade e trabalho digno”, afirma.

As percepções sobre desigualdade apresentaram variação de acordo com os marcadores sociais. No recorte racial:

  • 68% afirmam que pessoas brancas têm mais acesso ao mercado de trabalho que pessoas negras
  • 63% apontam a mesma vantagem da população branca no acesso a boas escolas
  • 60% sugerem disparidade entre pessoas brancas e negras em relação à moradia em bairros com infraestrutura adequada

Já no recorte de gênero, 55% dizem que homens têm mais chances de ocupar bons empregos com bons salários que mulheres, proporção que sobe para 59% entre mulheres e para 65% entre os jovens de 18 a 24 anos.

As desigualdades territoriais aparecem de forma ainda mais consensual: 7 em cada 10 brasileiros acreditam que moradores de cidades grandes tem mais acesso a serviços do que os de municípios menores, desde frequentar boas escolas e universidades até disputar vagas de emprego.

Corrupção e má gestão lideram causas da desigualdade

A ausência de políticas públicas, 24%, e a má gestão governamental, 18%, aparecem como as principais causas da desigualdade no Brasil, segundo os entrevistados. Para Alan Valadares, o dado ilustra como a população associa a disparidade social ao desempenho do Estado.

“Existe uma expectativa de que o poder público resolva os problemas da desigualdade. Essa é a forma como as pessoas conseguem tangenciar essa questão”, afirma Valadares.

Dentro desse recorte, 76% concordam que a impunidade diante da corrupção contribui para a manutenção das desigualdades, e 75% afirmam que práticas como o “jeitinho brasileiro” favorecem quem é privilegiado. A percepção de que as leis e o funcionamento da economia beneficiam poucos e prejudicam os mais pobres também é majoritária, com 70% de concordância.

Apenas 7% atribuem a má distribuição de renda como fator principal para a desigualdade social no Brasil.

Os dados também dialogam com o sentimento mais amplo de descrença política: apenas 20% dos brasileiros afirmam se sentir representados pelos atuais governantes. Para metade dos entrevistados, a baixa representatividade resulta em políticas públicas que não priorizam os mais pobres.

Valadares avalia que a predominância de que a corrupção e a má gestão pública alimentam a desigualdade ganha mais força quando se observa o impacto do trabalho precoce na vida dos brasileiros.

Nas classes mais altas o trabalho precoce pode representar experiência sem necessariamente comprometer os estudos. Já para os grupos mais pobres, a realidade é outra.

Segundo a pesquisa, a entrada precoce no mercado de trabalho faz parte da vida da maioria dos entrevistados. Pelo menos 6 em cada 10 respondentes começaram a trabalhar antes dos 18 anos. Um terço iniciou essa trajetória por volta dos 14. O movimento, porém, gera efeitos diferentes conforme a classe social.

Entre os mais pobres, principalmente classe D/E, a necessidade de contribuir com a renda familiar leva quase metade, 49%, a começar a trabalhar cedo.

Outros 51% relatam que isso prejudicou a continuidade dos estudos. Já entre os mais ricos, o trabalho precoce aparece mais associado ao desejo de conquistar autonomia e consumo. Apesar de 62% acreditarem que começar a trabalhar cedo ajudou na vida profissional, a pesquisa sugere que a noção de prejuízo nos estudos é maior entre os mais pobres.


Fonte: Estadão

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