Empresas e oposição fazem ofensiva contra alta do IOF, e Hugo Motta diz que Brasil não precisa de mais imposto
Entidades empresariais pediram que Congresso tome atitude contra medidas de Haddad, mas derrubada de decreto não é consenso entre parlamentares
Marianna Holanda Adriana Fernandes
Brasília
Em meio à ofensiva da oposição e de entidades empresariais contra o aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), criticou nesta segunda-feira (26) o governo do presidente Lula (PT) e disse que o Brasil não precisa mais de impostos.
A declaração foi feita no X, antigo Twitter, e ocorre após o governo anunciar o aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) em contratação de crédito para empresas e compra de moeda estrangeira em espécie, entre outras situações. A medida enfrenta resistências no empresariado e virou alvo de críticas da oposição.
“O Executivo não pode gastar sem freio e depois passar o volante para o Congresso segurar. O Brasil não precisa de mais imposto. Precisa de menos desperdício”, afirmou.
A oposição tanto na Câmara quanto no Senado apresentou uma dezena de projetos para sustar as medidas anunciadas na semana passada pelo Ministério da Fazenda.
Lideranças e aliados de Motta classificaram as medidas do governo como barbeiragem, mas não há consenso sobre as propostas para derrubada do decreto. O presidente da Câmara pretende levar o assunto para debate no colégio de líderes.
Segundo relatos, Motta não foi avisado com antecedência das medidas da Fazenda, o que trouxe incômodo à cúpula da casa. Reservadamente, ao comentar o tema, relembram últimas crises envolvendo medidas do ministro Fernando Haddad (Fazenda), como a do Pix e da taxação das blusinhas –ambos amplamente explorados pela oposição.
Uma ala dessas lideranças avalia que o recuo de Haddad em parte do decreto do IOF já é suficiente, outra diz não ser possível segurar a pressão contra a medida. Representantes do empresariado têm procurado parlamentares em busca da derrubada das novas regras.
Sete confederações e associações empresariais divulgaram nesta segunda-feira (26) um manifesto que apela ao Congresso para derrubar o decreto. “Esperamos que o Congresso Nacional se debruce sobre o tema e avalie com responsabilidade a anulação do teor do decreto do governo. O Brasil ostenta uma das maiores cargas tributárias do mundo”.
As entidades cobram um ambiente melhor para crescer e rejeitam o aumento de mais impostos. “É hora de respeitar o contribuinte”, diz o manifesto. No documento, as entidades afirmam que a decisão gera imprevisibilidade e aumenta os custos para produzir no país. Elas calculam que o custo dos negócios com operações de crédito, câmbio e seguros vão aumentar R$ 19,5 bilhões apenas no que resta do ano de 2025.
“A medida encarece o crédito para empreendimentos produtivos, aumentando a carga tributária do IOF sobre empréstimos para empresas em mais de 110% ao ano”, destacam as confederações.
Assinam o manifesto as confederações do comércio (CNC), indústria (CNI), companhias abertas (Abrasca), instituições financeiras (CNF), agricultura e pecuária (CNA), seguros (CNseg) e cooperativas (OCB).
“O decreto aumenta ainda mais o custo de financiamento das empresas no Brasil num momento de taxas de juros elevadíssimas. Há ainda um elemento que não foi equacionado, ou o foi apenas para os fundos, que é a oneração dos investimentos feitos no exterior”, diz Pablo Cesário, presidente-executivo da Abrasca.
“Essas medidas não se sustentam. Elas não têm respaldo técnico, jurídico nem econômico. São um golpe contra o setor produtivo e contra a população brasileira”, disse o líder da oposição, Coronel Zucco (PL-RS), ao anunciar ter entrado com um desses projetos.
“O recuo tem que ser total. Nenhuma dessas medidas pode permanecer de pé. Nenhuma”, completou. O líder da oposição está também coletando assinaturas para um requerimento de urgência ao projeto.
Em outra frente, Zucco também protocolou requerimento para convocar Haddad para explicar a medida.
Nesta segunda-feira, o ministro Fernando Haddad defendeu que o governo trabalha para reduzir um déficit estrutural herdado de governos anteriores e que o desafio de equilibrar o Orçamento “é de todos”. O ministro afirmou no Rio de Janeiro que o governo decidirá até o fim de semana como compensar recuo em alguns dos aumentos.
“Nós temos até o final de semana para decidir como compensar, se com mais contingenciamento ou com alguma substituição [por nova receita]”, disse a jornalistas em entrevista após participar de evento em alusão ao dia da Indústria no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Haddad disse que a carga tributária já foi mais alta no país e citou parte da defesa feita anteriormente por Mercadante para cobrar também sobre o Congresso Nacional responsabilidade pelo controle do Orçamento.
“Hoje a carga tributária federal, a receita primária federal, é menor do que dez anos atrás. Então nós temos que ter a compreensão de que nós temos desafios a enfrentar, sobretudo em relação ao equilíbrio orçamentário, que como disse o Mercadante, é papel de todos”, respondeu o ministro em seu discurso.
“Quando a gente olha para as contas e vê que muita despesa foi contratada sem fonte de financiamento, nós temos que compreender que nós temos que honrar os compromissos assumidos pelo Congresso, muitos deles compromissos constitucionais”, afirmou Haddad.
Ele afirmou que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está “tentando virar a página de um déficit estrutural” e voltou a questionar lobbies que conseguem benefícios no Congresso.
“Ao invés de oferecer uma alíquota média de tributos menor para todo mundo, a gente resolve escolher lá no Orçamento os campeões nacionais que levam o grosso do Orçamento. Enquanto aquele que paga imposto fica prejudicado por aquele que fez do lobby a sua profissão de fé”, disse.
Como a Folha mostrou, o governo já estava preocupado com o uso que a oposição faria das mudanças no IOF.
Integrantes do governo citaram como exemplo o que ocorreu no caso do Pix, quando no ano passado a disseminação de informações distorcidas sobre taxação dessas operações invadiu as redes e afetou a popularidade do presidente.
A pressa em revogar as medidas foi uma tentativa de evitar o que auxiliares no Planalto temiam ser um novo “efeito Nikolas”, em referência ao alcance dos vídeos do deputado bolsonarista Nikolas Ferreira (PL-MG) —um dos autores dos projetos para sustar o decreto do IOF.
Além do IOF, a equipe econômica também anunciou congelamento de R$ 31,3 bilhões em despesas do Orçamento de 2025 para cumprir o limite de gastos do arcabouço fiscal. As medidas ocorrem após aumento de gastos obrigatórios e frustração com receitas.
O governo, no dia seguinte ao anúncio, recuou de parte das medidas do IOF.
A versão inicial previa a cobrança de uma alíquota de 3,5% sobre as aplicações de fundos nacionais no exterior a partir da sexta-feira (23), que antes tinham alíquota zero. A alteração tornou-se um dos pontos mais polêmicos, apontado por representantes do mercado financeiro a integrantes do governo.
Uma segunda mudança, segundo a Fazenda, buscou esclarecer que remessas de contribuintes brasileiros ao exterior que sejam destinadas a investimentos continuarão sujeitas à alíquota atual de 1,1%, sem alterações. Pela versão anterior, essa cobrança também subiria a 3,5%. Segundo relatos, o governo identificou que essa alteração estava sendo alvo de desinformação em grupos de mensagem. Integrantes do Executivo afirmam que não havia intenção de elevar o imposto para quem envia dinheiro ao exterior para comprar uma casa, por exemplo, por isso optaram pelo ajuste na redação.
Fonte: Folha de São Paulo