O fiasco do arcabouço fiscal: tamanho descrédito em tão pouco tempo não sairá barato para o Planalto
Não chegou a durar dois anos. Foi no final de março de 2023 que o governo anunciou o novo arcabouço fiscal, um regime alternativo de gestão das contas públicas que, supostamente, substituiria com vantagem o teto de gastos. Mas o rearranjo só entrou em vigor de fato cinco meses depois, em 31 de agosto de 2023.
Não faltou quem apontasse, desde o primeiro momento, quão precário e mal concebido era o novo regime com que o governo pretendia manter as contas públicas sob controle.
E à medida que o arcabouço foi posto em prática, suas óbvias deficiências só exacerbaram as apreensões com a ineficácia, a inconsistência e a fragilidade das novas regras fiscais.
Na semana passada, o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias submetido ao Congresso foi visto como a última palha no descrédito do arcabouço, por trazer à luz do sol duas constatações alarmantes.
O governo não tem ideia de como viabilizar a contenção de despesas e o crescimento fantasioso de receita requeridos para tornar factíveis as metas pífias de resultado primário que anunciou para os próximos anos. E, pior, só agora se deu conta de que, em 2027, a expansão desmesurada e enrijecida de gastos prevista no arcabouço exigiria uma compressão tão absurda de despesas discricionárias que tornaria o Orçamento inexequível.
Tamanho descrédito em tão pouco tempo não sairá barato para o Planalto. Esvaiu-se a esperança de que, com jeito, a conversa mole do governo sobre a condução da política fiscal poderia ser esticada até as eleições de outubro do ano que vem.
Em 2014, Dilma Rousseff conseguiu se reeleger porque “fez o diabo” para esconder do País, até a apuração do segundo turno, a gravidade da deterioração por que vinha passando o quadro fiscal.
Lula terá menos sorte. Está fadado a atravessar nada menos do que 17 meses, até as eleições de outubro, tentando explicar o inexplicável sobre a gestão fiscal desastrosa de seu governo.
Terá de esclarecer, por exemplo, como foi mesmo que se permitiu deixar que o endividamento público desse um salto da ordem de 12 pontos porcentuais do PIB ao longo de um único mandato presidencial. Três pontos porcentuais do PIB por ano de governo.
É fácil perceber que o estrepitoso fiasco do arcabouço, quase um ano e meio antes da disputa presidencial, tornou a reeleição de Lula ainda mais difícil do que já se afigurava. O descontrole das contas públicas deverá ser uma questão central na campanha. O que, de sério e crível, terá o presidente a propor sobre a condução da política fiscal em 2027?
Fonte: Estadão