Congresso vê decisão do STF ‘inevitável’ sobre fake news e teme ‘sangue nos olhos’
Caminho mais provável é regulamentar retirada de conteúdo em ação sobre marco civil da internet
São Paulo e Brasília
O retorno à estaca zero do projeto que regulamenta as big techs gerou em parte do Congresso a avaliação de que será inevitável que o STF (Supremo Tribunal Federal) regule o tema, diante dos atritos recentes com o empresário Elon Musk, dono da rede social X.
Esses mesmos parlamentares, no entanto, temem que os embates levem os ministros a adotarem uma orientação mais rígida do que a que o Congresso teria justamente pelos ataques de Musk ao ministro Alexandre de Moraes.
Na última terça-feira (9), o ministro Dias Toffoli divulgou uma nota em que indicou que o julgamento do recurso extraordinário que discute a constitucionalidade de artigo do marco civil da internet deve ser retomado até o final de junho.
O artigo 19 determina a necessidade de prévia e específica ordem judicial de exclusão de conteúdo para a responsabilização civil de provedor de internet, sites e aplicativos de redes sociais por danos decorrentes de atos ilícitos praticados por terceiros.
Na nota, Toffoli escreve que “em razão de solicitação para se aguardar a votação, na Câmara dos Deputados, de novas regras dispondo sobre a matéria, o julgamento do caso acabou não ocorrendo em 2023.”
Sem perspectiva de que o Congresso legisle sobre a questão no curto prazo, a expectativa é que esse recurso acabe servindo para o Supremo regulamentar a atuação das big techs na retirada de conteúdo indevido, segundo interlocutores da corte. A solução não é tida como a ideal, mas necessária diante da falta de ação do Legislativo.
Na avaliação de Renata Mielli, coordenadora do Comitê Gestor da Internet, a solução não seria a ideal, porque o artigo 19 não foi feito para regular ou moderar conteúdo em plataforma de rede social. “O artigo 19 fala em provedor de aplicação de internet”, diz. “Então não está falando de plataforma de rede social que oferece um tipo específico de serviço que não é neutro, porque a rede social é um editor de conteúdo.”
Ela lembra que o conteúdo consumido pelo usuário é resultado de um algoritmo e pode ser alterado com dinheiro aplicado para aumentar o engajamento. “Então eles precisam responder por isso, porque eles, de fato, estão fazendo curadoria de conteúdo, uma curadoria que pode ser automatizada por engajamento, por uma série de mecanismos algoritmos de perfilização ou por uso de poder econômico.”
Mielli explica que o artigo 19 foi feito para aplicações que são neutras e que não deveriam ser responsabilizadas judicialmente por conteúdo dos terceiros, como o WordPress. “Quantos e quantos sites no Brasil são hospedados usando WordPress? O WordPress não modera o conteúdo e não interfere na visibilidade maior ou menor do que aquele site vai ter.” “Se a gente tira o marco civil da internet e diz que o provedor de aplicação se torna responsável pelo conteúdo do terceiro mediante mera notificação, então significa que se eu mandar uma mensagem para o WordPress e dizer que o WordPress tira o site X do ar, ele tem que tirar”, conclui.
Fonte: Folha de São Paulo