‘Super-ricos’: relator reduz a 6% alíquota para regularizar fundos e deixa JCP de fora
BRASÍLIA – Divulgado na noite desta terça-feira, 3, o relatório do deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) sobre o projeto de lei que tributa os fundos de investimentos dos “super-ricos” – exclusivos e offshore (no exterior) – deixou de fora a mudança nos juros sobre capital próprio (JCP), um tipo de remuneração feita pelas grandes empresas aos seus acionistas.
A inclusão do JCP havia sido proposta pelo próprio deputado ao governo e a líderes partidários, mas a ideia não avançou diante da resistência de parlamentares sobre a medida, o que poderia inviabilizar a votação dos fundos da alta renda. A equipe econômica prevê arrecadar cerca de R$ 20 bilhões com fundos offshore e exclusivos em 2024.
O relatório de Pedro Paulo demonstra, contudo, que o Ministério da Fazenda cedeu a Arthur Lira (PP-AL) em alguns pontos. Lira havia defendido que o contribuinte brasileiro que atualizar seus investimentos no exterior para o valor de mercado em 31 de dezembro de 2023 fosse tributado pelo ganho de capital em 6%, e não em 15% como prevê a legislação atual.
A oferta original da Fazenda era que essa taxação fosse de 10%, mas diante da resistência de Lira e a necessidade de ampliar a arrecadação, a equipe de Haddad sinalizou que aceitava o acordo, como antecipou o Estadão em agosto.
O relator também baixou de 10% para 6% a tributação incidente sobre os fundos exclusivos no Brasil que optarem por antecipar a vigência da taxação para este ano. A alíquota cheia a partir de 2024 será de 15% a 20%, a depender se o fundo é curto ou longo prazo.
Pedro Paulo passou boa parte da terça-feira tentando convencer o governo e os demais deputados a incluir JCP no projeto dos fundos. Com isso, três medidas da lista de ampliação da arrecadação da lista do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, entrariam na pauta de votações da Câmara de uma só vez.
Mas a junção não estava no radar de líderes partidários, que demonstraram contrariedade com a proposta inicial do Ministério da Fazenda de acabar com a dedutibilidade (possibilidade de abatimento nos tributos devidos) sobre o JCP.
O JCP é um instrumento usado por grandes companhias para remunerar acionistas. Ele permite que a distribuição de lucros seja enquadrada como despesa – e, assim, abatida do Imposto de Renda (IR) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
A alteração, segundo as grandes empresas de capital aberto, inviabilizaria o instrumento, que permite que elas paguem menos impostos ao remunerar seus investidores.
O foco do governo, ao mirar nesse instrumento, é atacar o planejamento tributário agressivo feito por empresas de grande porte da chamada economia real para pagar menos tributos. A equipe econômica argumenta que o uso do mecanismo foi desvirtuado e deve ser extinto.
Em reunião na residência oficial do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), nesta terça, o líder do União Brasil, Elmar Nascimento (União-BA) foi um dos que se posicionaram contra o projeto de mudar o JCP, alegando que se trata de um aumento de carga tributária, uma pauta eminentemente “de esquerda”.
A Fazenda estima que pode arrecadar até R$ 10,5 bilhões em 2024 com a alteração, em meio a um esforço da equipe econômica para zerar o rombo das contas públicas no ano que vem.
Outros três líderes partidários consultados pelo Estadão disseram, sob reserva, que também são contrários à proposta da Fazenda.
O deputado, segundo os colegas, tentaria negociar com a equipe de Haddad uma alternativa menos dura para as empresas e, principalmente, para o setor financeiro, que se queixa de que será o segmento mais penalizado com o fim do JCP. Uma das alternativas ensaiadas era excluir o setor financeiro das mudanças do JCP.
A taxação dos fundos, no entanto, encontram ambiente mais simpático na Câmara nesta semana e a previsão é de que ele possa ser colocado em votação nesta quarta-feira, 4.
“Não vejo dificuldade na taxação dos fundos porque os grandes investidores precisam pagar um pouco mais de impostos”, afirmou o presidente do Republicanos, Marcos Pereira (Republicanos-SP).
O trâmite acelerado imprimido por Lira nas medidas, até então paradas há pouco mais de um mês na Câmara, foi relativizado por líderes partidários, ainda que a votação tenha sido marcada antes mesmo de haver um relatório pronto.” Lira disse na reunião na semana passada que colocaria fundos em votação nesta semana, não há mudança de planos aí”, afirma o líder do PSB, Felipe Carreras (PSB-PE).
Deputados de diferentes partidos e assessores têm uma leitura diferente. Veem na disposição de Lira um sinal de que o presidente da Câmara conseguirá, enfim, nomear o presidente da Caixa, como deseja. A troca foi negada por Lula na semana passada, mas depois disso houve uma ação de bombeiros que freou a ira de Lira.
Segundo apurou o Estadão, um destes bombeiros foi o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais), que defendeu dentro do governo o acordo firmado com o presidente da Câmara.
Tanto a presidência da Caixa, prometida a Lira, quanto o comando das 12 vice-presidências do banco deverão ser entregues aos parlamentares. Outros dois bombeiros foram o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), e o líder do PT, Zeca Dirceu (PT-PR).
Outro fator que ajuda a explicar a mudança de ares no Parlamento na agenda de Haddad é a previsão de votação, também nesta semana, de autorizações para o governo pagar emendas parlamentares emperradas à espera de remanejamentos orçamentários. Para isso, está agendada, também para esta quarta-feira, uma sessão de votações de Congresso Nacional (em que as duas Casas votam juntas).
Fonte: Estadão