Brecha para estados criarem tributos não prejudica muito, diz presidente da CNI
Robson Andrade afirma que entidade trabalhará pela aprovação no Senado da mesma forma como foi na Câmara
Joana Cunha
São Paulo
Apesar da tensão gerada pela emenda colocada de última hora na Reforma Tributária, que abre brecha para a criação de um novo tributo pelos estados, o presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Robson Andrade, afirma que não vê problemas, só soluções, após a aprovação pela Câmara.
A emenda inesperada, que autoriza governadores a cobrarem contribuição sobre produtos primários e semiacabados para financiar fundos estaduais, levou apreensão às indústrias de minério de ferro, petróleo e setores do agro, que temem aumento na carga tributária com impacto nas exportações. Associações setoriais como o Ibram (que reúne mineradoras) já se articulam para tentar derrubar o trecho no Senado.
\”Entendo a posição do relator, o deputado Aguinaldo, de que na última hora teve de fazer algumas concessões, alguns acordos, para poder ter a garantia da aprovação da reforma. Isso acaba não prejudicando muito\”, afirma Andrade.
Segundo ele, a CNI vai trabalhar para que, no Senado, a reforma seja aprovada da mesma forma como ela foi feita na Câmara.
A CNI apoiou muito a Reforma Tributária. Depois de aprovada na Câmara, quais são os problemas que precisam ser resolvidos no Senado?
Não vejo problemas. Eu só vejo soluções. A aprovação é um momento histórico. Todos os setores, governadores, presidentes que passaram pelo Senado e pela Câmara falavam em fazer a Reforma Tributária.
Você poderia perguntar a todos os governadores se eles estavam satisfeitos com a situação tributária no Brasil, e eles iriam dizer que não. E [se perguntasse] se eles queriam a reforma, eles iriam dizer que sim. Mas cada um tinha um olhar mais para essa ou aquela questão. Não estou dizendo que a reforma aprovada tenha sido unanimidade, mas é o que poderia ter sido feito e foi muito bem feito. Estamos comemorando e concentrados para ajudar que essa aprovação também aconteça no Senado o mais rápido possível.
O que vocês acharam da emenda que propõe a contribuição sobre os itens primários e semiacabados para financiar os fundos estaduais?
É claro que, na última hora, alguns acordos tiveram que ser construídos. Entendo a posição do relator, do deputado Aguinaldo [Ribeiro (PP-PB)], de que na última hora teve de fazer algumas concessões, alguns acordos, para poder ter a garantia da aprovação da reforma. Acho que isso acaba não prejudicando muito. São negociações que foram feitas de última hora. É claro, tem sempre um impacto em alguma coisa, mas eu acho que vai ser bom. Acho que não vai trazer nenhum comprometimento para a reforma como um todo.
A CNI pretende combater isso de alguma maneira?
Estamos na posição de trabalhar pela aprovação da reforma da forma como ela foi feita na Câmara. Inclusive, de maneira que ela não tenha que voltar para a Câmara. Que ela seja consolidada no Senado. Talvez, algumas mudanças possam ser feitas sem que comprometa a estrutura, o arcabouço, da reforma.
Os críticos dizem que a reforma desloca a carga tributária, favorece alguns setores específicos. Essa discussão está superada?
Na CNI, nós analisamos essa reforma não só do ponto de vista da indústria. Nós analisamos do ponto de vista de Brasil, porque o nosso sistema tributário penalizava não só a indústria. Mesmo que outros setores tivessem um benefício tributário, no final, ele acabava ficando prejudicado, porque o país não cresce, não desenvolve, tem dificuldade de fazer acordos internacionais, de atrair investimentos. Como não tem investimento, você tem dificuldade de gerar emprego. Então, a CNI olhou essa reforma com uma visão mais de país, de dar à população e à sociedade a transparência no pagamento de impostos, porque quem paga imposto é o consumidor.
Acho que tem alguns setores que, primeiro, estão olhando para o próprio umbigo. E não estão vendo o que isso pode trazer para o Brasil a médio prazo. Por exemplo, a estimativa da Universidade Federal de Minas Gerais é a de que o PIB pode crescer de 12% a 15% em um prazo de dez anos com a reforma. Isso vai beneficiar todo mundo. Então, você pode perder um pouco agora, mas vai ter um benefício de crescimento e desenvolvimento. Nesse estudo, existe a perspectiva de se gerar 8 milhões de empregos no Brasil.
Qual é a expectativa da CNI para a alíquota do IVA (Imposto sobre Valor Agregado)?
O que nós vimos que foi colocado é uma trava de que não pode haver aumento de carga tributária. Esse é o principal ponto. Hoje, a indústria paga, só dos impostos federais, em torno de 34%, e nós esperamos que isso caia para em torno de 25%.
E as exceções setoriais? Qual deve ser o impacto na alíquota?
É claro que nas exceções você está falando de setores como saúde, educação, transporte coletivo. No mundo inteiro existe isso porque são setores que atendem à população, principalmente a mais carente. Tanto na saúde quanto na educação e transporte coletivo, é preciso que você tenha um diferencial de não onerar esses setores, senão, realmente, aumentaria o custo para a sociedade que nós queremos privilegiar.
Na sua opinião, o que pode ser aprimorado no Senado?
Nós não estamos trabalhando com essa perspectiva de aprimorar no Senado. Nós tivemos no passado a discussão de duas PECs [Proposta de Emenda à Constituição]. A 45, que começou na Câmara, e a 110, no Senado. Hoje, essa proposta que foi aprovada na Câmara, na realidade, tem entre 60% e 70% da própria PEC 110. Ela é uma mistura das duas PECs muito bem preparada.
Nós não estamos preparando nenhuma proposta de mudança ou de alteração do que foi aprovado na Câmara para discussão no Senado. Nós vamos apoiar. Agora, caso os senadores apresentem, alguma discussão vai ter sobre desenvolvimento regional, sobre o fundo, principalmente para incentivos das empresas que estão instaladas no Norte e no Nordeste. Estamos abertos a discutir, com certeza. Mas não vamos preparar nenhuma proposta de alteração daquilo que foi aprovado.
Como estão vendo os pontos que vão ficar para lei complementar, como a questão do crédito do imposto?
A lei complementar realmente nos preocupa. Nós vamos ter que trabalhar muito nessa questão porque ela depende de um quórum não qualificado e nós vamos ter que discutir. Hoje a sociedade está madura para poder interferir. O que a gente vê é que não se consegue colocar qualquer coisa goela abaixo. Então, vamos ter que discutir. É legítimo. Todos os setores vão ter de participar. E nós vamos participar defendendo o setor industrial e a geração de emprego.
Fonte: Folha de São Paulo