Receita detalha transação, mas gargalos que levam contribuintes à Justiça permanecem

Em portaria publicada nesta terça-feira (22) no Diário Oficial da União, a Receita Federal trouxe nova regulamentação à transação tributária. A norma traz poucas novidades em relação ao que já vinha sendo praticado pelo órgão, porém deixa evidente algumas situações em que entende que é possível recorrer à transação.
Apesar das mudanças favoráveis aos contribuintes, porém, especialistas afirmam que permanecem intactos os gargalos que fazem com que pessoas físicas e jurídicas recorram à Justiça para “forçar” a inscrição de débitos em dívida ativa. O deferimento dos pedidos pela via judicial permite a realização de acordos de transação tributária com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que possui mais de dez modalidades de transação abertas.
Entre os esclarecimentos trazidos pela Portaria 247/22 está a possibilidade de realização de transação para temas que não estão em processos administrativos fiscais (PAFs). É o caso, por exemplo, das discussões sobre programas de parcelamento, compensação considerada não declarada e arrolamento de bens e direitos na substituição de garantias.
Em relação aos programas de parcelamento, a norma deixa claro que estão submetidos à transação os parcelamentos que se encontrem em contencioso prévio à exclusão do contribuinte.
Apesar da diretriz ser positiva aos contribuintes, porém, especialistas questionam a abrangência do debate e a quantidade de pessoas físicas e jurídicas na situação detalhada pela portaria.
Já em relação à alteração de garantias, o esclarecimento da Receita diz respeito às situações em que os contribuintes querem alterar os bens dados em garantia. Segundo Marcos Hubner Flores, coordenador-geral de Administração do Crédito Tributário da Receita, a mudança pode ocorrer para incluir um seguro-garantia ou carta fiança ou para liberar o patrimônio de uma pessoa física indicada como responsável solidária, por exemplo.
“Todo mundo ganha. A pessoa física vai ter seu bem desarrolado. A empresa dá conforto, dá segurança para seus diretores, para as pessoas que trabalham junto com ela, de que se ocorrer um auto de infração ela pode liberar o bem dessas pessoas dando um seguro-garantia. E para a Receita é ótimo também porque o seguro-garantia é muito mais seguro do que um arrolamento de bens”, afirma Flores.
Nestes casos, porém, não haverá discussão sobre o débito em si, apenas sobre a troca da garantia.
O advogado Leandro Cabral e Silva, do Velloza Advogados Associados, destaca que os contribuintes vinham tendo dificuldade em negociar com a Receita a alteração de bens. “A Instrução Normativa de arrolamento de bens [IN 2091/22] prevê a possibilidade de substituição de bens arrolados, mas na prática a Receita dificulta bastante a substituição de bens por bens de igual natureza”, diz.
Outro ponto esclarecido pela Receita na Portaria 247 é o momento de suspensão do débito transacionado. De acordo com a norma, o valor não pode ser cobrado a partir do deferimento da transação. Segundo integrantes da Receita, alguns contribuintes tinham dúvidas se a impossibilidade de cobrança valeria a partir do pedido de negociação.
Atualmente estão abertos dois editais de transação tributária no âmbito da Receita, voltados a débitos de até 60 salários mínimos e créditos irrecuperáveis não inscritos em dívida ativa. As modalidades ficam abertas até 30 de novembro de 2022.
Além disso, há a possibilidade de transação individual, proposta pelos contribuintes ou pela Receita a pessoas físicas e jurídicas com débitos superiores a R$ 10 milhões. E a partir de 1º de janeiro será disponibilizada ainda a transação simplificada, por meio da qual será possibilitada a negociação de débitos entre R$ 1 milhão e R$ 10 milhões.
Segundo dados da Receita, entre 2020 e 2021 foram realizadas mais de 12,6 mil adesões à transação tributária. Já nos editais lançados em setembro, e que ainda estão em vigor, os pedidos de adesão passam de 2.600.
Ações judiciais
Atualmente, um dos principais contenciosos judiciais relacionados à transação tributária diz respeito à proposição de mandados de segurança “forçando” a Receita a inscrever débitos em dívida ativa. Com isso os contribuintes conseguem transacionar débitos com a PGFN, que hoje tem mais de dez modalidades de transação abertas.
É o caso, por exemplo, de pessoas físicas e jurídicas que perderam processos no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), mas ainda não tiveram seus débitos inscritos em dívida ativa. Com isso, não é possível aderir à transação na Receita ou na PGFN.
Mariana Rodrigues, advogada tributarista no Finocchio e Ustra Sociedade de Advogados, explica outra situação em que os contribuintes têm ido à Justiça. “Houve esclarecimento de alguns débitos que podem ser incluídos na transação, mas a maior parte dos débitos são os declarados e não pagos, e não aqueles objeto de contencioso administrativo”, afirma.
Os débitos declarados pelos contribuintes não entram na transação da Receita. É o caso, por exemplo, da pessoa física que fez a declaração do Imposto de Renda e se deparou com valores a pagar ou de cifras informadas por empresas à Receita por meio de Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF).
“Nessa situação a gente não pode transacionar porque não há litígio”, diz Sandra Maria Ribeiro, supervisora nacional da transação na Receita.
A advogada Andrea Mascitto, do Pinheiro Neto Advogados, também acredita que não haverá alterações em relação ao cenário de judicialização. Ela destaca, porém, a criação da Equipe Nacional de Transação de Créditos Tributários, voltada a debater e elaborar materiais sobre transação tributária. A formação do grupo consta na Portaria 248, também publicada nesta terça no Diário Oficial.
Para a tributarista, a junção de pessoas com expertise em transação tributária pode gerar uma curva maior de aprendizado sobre o tema.
Bárbara Mengardo – Editora em Brasília.


Fonte: JOTA

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