STF decide que propor ação de improbidade não é exclusividade do Ministério Público
Para a corte, entes afetados também podem ingressar no Poder Judiciário
Marcelo Rocha José Marques
Brasília
O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quarta-feira (31) que a apresentação de ações de improbidade administrativa não é exclusiva do Ministério Público, como previa o texto da nova lei sobre o tema.
Por 8 votos a 3, foi decidido pela inconstitucionalidade do dispositivo que restringiu ao Ministério Público essa iniciativa em detrimento de entes públicos nas esferas federal, estadual e municipal. Para a corte, entes afetados por atos de improbidade também podem ingressar no Poder Judiciário.
O julgamento começou no último dia 24 e só foi encerrado nesta quarta.
O debate faz parte de um conjunto de ações que questionavam a nova lei. No último dia 18, o Supremo concluiu outro julgamento que decidiu de forma favorável a acusados de improbidade em casos em andamento.
As ações foram propostas pela Anape (Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do DF) e pela Anafe (Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais) para questionar a constitucionalidade de trechos da lei nº 14.230/21.
Ao assegurar apenas ao Ministério Público a iniciativa de propor ação de improbidade, sustentaram as entidades, a nova lei tirou da União, dos estados, do Distrito Federal e dos mun
As associações disseram que a norma representa afronta à autonomia da advocacia pública por estabelecer que somente o Ministério Público poderia buscar o ressarcimento do dano ao erário.
Para o presidente da Anape, Vicente Braga, que fez a defesa da ação na tribuna, a possibilidade de ajuizar ações de improbidade administrativa é essencial para a atuação da advocacia pública.
\”O ente público lesado deve ter o direito de buscar a reparação ao dano causado e a punição dos atos ilícitos, pois é exatamente ele que pode melhor mensurar os prejuízos provocados pelo agente\”, afirmou Braga.
Representando a Anafe, o advogado Gustavo Binenbojm disse que prever o Ministério Público como legitimado único é criar um sistema \”capenga\”. Segundo ele, a prevalecer o novo texto, a administração pública pode averiguar e identificar atos de improbidade, uma obrigação constitucional, \”mas ficará à mercê das decisões unipessoais do promotor da comarca\”.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu a derrubada da restrição imposta pela nova lei da improbidade administrativa. Para Aras, \”quanto maior o número de agentes em defesa do patrimônio público, maior a possibilidade de torná-la mais eficiente\”.
Relator da matéria, o ministro Alexandre de Moraes disse que a legitimidade exclusiva atribuída ao Ministério Público foi proposta para conter abusos e arbitrariedades, mas que \”não se pode permitir que isso seja um obstáculo ao acesso à Justiça\”.
\”A lei não pode suprimir todos os órgãos, inclusive aqueles legitimados ordinariamente pela Constituição, estabelecendo uma inexistente privatividade do MP para propositura de ação de improbidade\”, afirmou o ministro.
Retirar da Fazenda Pública e da advocacia pública a possibilidade de ingressar com ações em proteção ao patrimônio público, segundo ele, fere a Constituição.
Por entender que restringir a iniciativa das ações de improbidade ao Ministério Público amplia o risco de maior corrupção e de não prevenção a ele, André Mendonça acompanhou o relator. \”O monopólio produz improdutividade, ineficiência e incrementa a corrupção\”, concluiu
O entendimento de Moraes no sentido de reconhecer a prerrogativa concorrente entre o Ministério Público e os entes públicos lesados para propor as ações de improbidade foi acompanhado por André Mendonça, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Luiz Fux.
Os ministros Kassio Nunes Marques, Dias Toffoli e Gilmar Mendes divergiram parcialmente. Kassio entendeu que nas hipóteses em que os atos de improbidade forem atentatórios a princípios da administração pública, sem efetivo dano aos cofres públicos, a prerrogativa é exclusiva do Ministério Público.
Para Toffoli, a legitimidade privativa do órgão para o ajuizamento de ações não afasta a legitimidade de entes públicos em ações civis de ressarcimento ao erário e celebração de acordo de não persecução civil que vise exclusivamente a esse fim. Quanto às demais sanções, continuaria a exclusividade do Ministério Público.
Fonte: Folha de São Paulo