O vai e vem da justiça

Carlos Pereira, O Estado de S.Paulo

13 de dezembro de 2021 | 03h00

Ao longo dos últimos anos o Brasil tem vivido uma verdadeira montanha russa com idas e vindas em decisões judiciais controversas, especialmente relacionadas a casos de corrupção.

O começo do cumprimento da pena, inicialmente admissível apenas após o trânsito em julgado, tornou-se possível depois de uma condenação em segunda instância, mas, recentemente, retornou ao trânsito em julgado; as condenações de Lula, Eduardo Cunha e Henrique Eduardo Alves foram anuladas; os crimes de corrupção associados a caixa dois, antes de competência da justiça criminal, são agora da justiça eleitoral; o compartilhamento de dados bancários e fiscais do Coaf e da Receita com a PF e MP passou a depender de prévia autorização judicial, etc.

Como confiar na Justiça diante de tamanha oscilação das suas próprias decisões? O ambiente de polarização política tem piorado ainda mais essa situação, pois a confiança das pessoas nas decisões judiciais não é livre de viés. Ou seja, a aparente racionalidade das pessoas para confiar ou não na Justiça pode ser motivada pela congruência da sua ideologia com a do acusado.

Será que a Justiça só seria justa e confiável quando punisse um desafeto, mas injusta e não confiável quando punisse o líder que ama?

Junto com os colegas da FGV André Klevenhusen e Lúcia Barros, fiz uma pesquisa de opinião experimental para investigar o papel da ideologia na confiança na Justiça em casos de corrupção.

Os resultados mostram que eleitores que possuem ideologia divergente da do candidato condenado apresentam níveis inalterados de confiança nas decisões judiciais. Este padrão se verificou em cenários de congruência (o candidato rejeitado é condenado) e indiferença (nem o candidato preferido nem o rejeitado são condenados) em relação aos veredictos da Justiça. No entanto, quando o candidato congruente com a ideologia do eleitor é condenado, a confiança no sistema de justiça diminuiu.

Os eleitores consideram os tribunais uma instituição imparcial para punir corruptos apenas quando seu candidato preferido não é o réu. Independentemente da volatilidade das decisões da Justiça, o eleitor já tem uma tendência de desconfiar dela quando ela causa dano ao objeto do seu afeto. Essa percepção tenderia a se potencializar se as decisões judiciais continuarem a apresentar esse perfil errático em curtos intervalos de tempo. Afinal de contas, a Justiça não pode ser um árbitro confiável, como é esperado em democracias, se as instâncias uniformizadoras superiores não forem vistas como consistentes e estáveis.


Fonte: Estadão

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