ICMS de energia e telecom: cinco estados registram 774 ações apenas em 2021
Dados, obtidos com exclusividade pelo JOTA, foram levantados pelo Colégio Nacional de Procuradores-Gerais dos Estados e do Distrito
Os estados registraram ao longo de 2021 um ajuizamento em cascata de ações questionando a constitucionalidade de uma alíquota de ICMS majorada, acima da alíquota geral, sobre energia elétrica e telecomunicações. Apenas nos estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Pará e Mato Grosso do Sul, os contribuintes ingressaram com 774 ações este ano questionando a alíquota majorada sobre esses serviços.
Os dados, obtidos com exclusividade pelo JOTA, foram levantados pelo Colégio Nacional de Procuradores-Gerais dos Estados e do Distrito Federal (Copeg) e encaminhados na última segunda-feira (6/12) aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
O presidente do Copeg e procurador-geral do estado do Maranhão, Rodrigo Maia, afirma que a alta no ajuizamento de ações em 2021 ocorreu diante da proximidade do julgamento no STF sobre o tema.
No julgamento de mérito do RE 714139, concluído em 22 de novembro, por oito votos a três, o STF reconheceu a inconstitucionalidade de uma alíquota de ICMS majorada sobre esses serviços. O caso concreto envolve o estado de Santa Catarina, que aplica uma alíquota de ICMS de 25% para esses setores, frente uma alíquota geral de 17%.
Nesta sexta-feira (10/12), o Supremo retoma o julgamento da modulação dos efeitos dessa decisão. Os magistrados vão definir a partir de quando a alíquota será de fato reduzida, o que pode impactar na possibilidade de restituição pelos contribuintes.
“As ações nos estados estão se multiplicando, uma vez que os contribuintes querem que o entendimento do STF no RE 714139 seja replicado. O problema é o impacto que essas decisões podem ter sobre a arrecadação dos estados”, afirma o presidente do colegiado.
Por ter repercussão geral, a decisão vincula o Poder Judiciário. Assim, além de eventuais ações individuais, o entendimento deverá ser aplicado no julgamento de ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs), derrubando as leis estaduais. Os estados ainda não identificaram o ajuizamento ADIs.
Os números mostram que, nos cinco estados do levantamento, o total de processos foi de 2.074 desde 2014, quando o STF reconheceu a repercussão geral do tema. Isso significa que 37,3% das ações nesses estados foram registradas apenas em 2021.
Em Santa Catarina, por exemplo, do total de 838 ações registradas desde 2014, 290 foram em 2021. No Rio Grande do Sul, foram 696 desde 2014 e 399 apenas este ano. No Espírito Santo, os números são de 402 e 30, respectivamente; no Pará, de 116 e 38; e no Mato Grosso do Sul, de 22 e 17.
Além disso, o colegiado afirma que o movimento de judicialização se intensificou em dezembro, em função do julgamento no STF. Em Santa Catarina, por exemplo, de 290 processos em 2021, 91 foram apenas em dezembro. Como os estados ainda não foram citados – ou seja, chamados no processo para se defender –, ainda não é possível saber a quantidade de novas ações após o julgamento de mérito.
De acordo com Maia, quase a totalidade das ações ajuizadas nos estados é individual, o que significa que a decisão sobre elas terá efeitos apenas sobre as partes no processo. A decisão do STF no RE 714139, por exemplo, como se trata de um recurso extraordinário, não derruba a lei do estado catarinense. Ela terá efeito apenas sobre as partes, com a redução da alíquota para as Lojas Americanas S.A no estado de Santa Catarina.
Pedido dos estados na modulação
Com os dados, o Copeg busca convencer os ministros do STF sobre a necessidade de a decisão ter efeitos a partir de 2024, quando começam os novos Planos Plurianuais (PPAs) dos estados. Os procuradores também pedem que não sejam ressalvados os processos judiciais em curso. Ou seja, mesmo para as ações anteriores ao julgamento do mérito, em 22 de novembro, os estados querem que os contribuintes não tenham direito a restituir valores pagos a mais nos cinco anos antes do ajuizamento dos processos.
“A nosso ver, diante do possível impacto sobre a arrecadação dos estados, a modulação dos efeitos não deve ressalvar as ações em curso. Mesmo para os processos anteriores ao julgamento de mérito, os efeitos devem se dar sobre os fatos geradores futuros, impedindo a restituição”, disse Rodrigo Maia.
Na manifestação encaminhada ao STF, o Copeg ressaltou ainda que, ao ressalvar processos em curso, o STF, ao contrário de assegurar a segurança jurídica, “incentiva, eleva e incrementa a judicialização no Brasil”.
Gilmar deve propor modulação a partir de 2024
O JOTA apurou que o ministro Gilmar Mendes deve propor a modulação dos efeitos da decisão do ICMS sobre energia e telecomunicações a partir de 2024, como defendem os estados.
O ministro havia pedido vista do processo, interrompendo o julgamento iniciado no dia 6 de dezembro. Agora, a votação recomeçará nesta sexta-feira (10/12) em plenário virtual, com prazo para apresentação de votos até 17 de dezembro.
O Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz) calcula uma perda anual de arrecadação de R$ 26,6 bilhões caso o entendimento do STF seja aplicado em todas as unidades da federação. Os números, porém, estão diretamente ligados à discussão sobre a modulação.
Antes do pedido de vista de Gilmar Mendes, o ministro Dias Toffoli registrou seu voto, defendendo que o entendimento do STF passe a valer a partir do próximo exercício financeiro, isto é, 2022, ressalvadas as ações ajuizadas até a véspera da publicação da ata do julgamento do mérito. Isso significa que, nesses casos, os contribuintes teriam direito a restituir os valores pagos a mais nos cinco anos antes do ajuizamento da ação.
Depois do pedido de vista de Mendes, Toffoli admitiu rever sua posição e postergar os efeitos da decisão.
Cristiane Bonfanti – Repórter do JOTA
Fonte: JOTA