PEC dos precatórios terá comissão especial comandada por base aliada do governo

Proposta autoriza União a não pagar todas as dívidas cobradas pela Justiça em 2022
rasília

A proposta que pode autorizar o governo a não pagar em 2022 todas as dívidas da União cobradas pela Justiça (chamadas de precatórios) será discutida na Câmara dos Deputados em uma comissão especial comandada por integrantes da base aliada.

A PEC (proposta de emenda à Constituição) foi enviada pelo governo ao Congresso para flexibilizar o pagamento de R$ 89,1 bilhões em precatórios e abrir espaço no Orçamento para outras despesas (como a expansão do Bolsa Família). O movimento foi feito após Executivo e parlamentares deixarem de buscar outras saídas –como, por exemplo, o corte de despesas em outras áreas.

A composição da comissão contou com a articulação do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). O presidente da comissão especial será o deputado Diego Andrade (PSD-MG) e o relator da proposta será Hugo Motta (Republicanos-PB), ambos alinhados ao governo.

O primeiro vice-presidente será Lucas Virgílio (Solidariedade-GO), a segunda vice-presidente será a deputada da oposição Maria do Rosário (PT-RS) e o terceiro vice-presidente será Bosco Costa (PL-SE).

Mesmo sob críticas e chamada pela oposição de calote e pedalada, a PEC que flexibiliza os precatórios já passou pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) por 32 votos a 26 e agora a tramitação continua na comissão especial, cuja função é examinar o texto, discutir modificações e votar um parecer final.

Motta disse que ouvirá os diferentes interessados, mas adiantou que sua relatoria buscará um trabalho rápido e com foco principal na abertura de espaço orçamentário “para quem precisa” –sinalizando um parecer pró-governo.

“Precisamos cuidar dos milhões de brasileiros que neste momento sofrem com a inflação dos gêneros alimentícios, e o governo precisa cuidar dessas pessoas. Esse será nosso principal foco”, disse.

Motta sugeriu que na próxima terça-feira (28) seja feita uma sessão deliberativa de requerimentos e já se apresente um cronograma para concluir os trabalhos o quanto antes. Ele afirmou que pretende ouvir o o ministro da Economia, Paulo Guedes, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, e o ministro do Tribunal de Contas da União Bruno Dantas, além de representantes de estados e municípios e os próprios parlamentares.

Motta disse que, no caso de Fux, a intenção é que a comissão faça uma visita ao presidente do STF para verificar se ele poderá participar de uma audiência da Câmara ou enviar um representante do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) para tratar do assunto.

O relator também propôs convite a representantes dos secretários de Fazenda estaduais e da Confederação Nacional dos Municípios.

Na terça-feira (21), Lira falou sobre a tramitação da PEC na comissão. \”Iremos contar prazo de segunda a sexta para agilizar a tramitação do prazo mínimo de dez sessões, para que possamos levar a plenário e remetê-la ao Senado o mais rapidamente possível.\”

O principal efeito da PEC original do governo é abrir um espaço de R$ 33,5 bilhões no Orçamento de 2022 ao possibilitar o parcelamento de precatórios em até dez anos. O texto também prevê a criação de um fundo para pagar as sentenças judiciais abastecido com recursos de diferentes fontes (como a venda de imóveis e estatais, dinheiro obtido com lucros de empresas públicas, concessões e corte de benefícios tributários), o que não seria contabilizado no teto de gastos.

O texto da PEC, no entanto, deve ser modificado para abrir ainda mais espaço no Orçamento após um acordo do ministro Paulo Guedes (Economia) com Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Essa saída estava sendo negociada também com o Judiciário, mas não foi adiante.

O novo texto acordado não prevê parcelamento, mas sim um limite anual para pagamento de precatórios. Em 2022, o limite seria de R$ 39,9 bilhões –o que abre um espaço no Orçamento de 2022 de R$ 49,1 bilhões.

O limite em discussão é baseado no teto de gastos da União, regra constitucional que impede o crescimento real das despesas federais. O montante em discussão para 2022 é igual ao total de sentenças judiciais pagas pela União em 2016, quando foi criado o teto, mais a inflação.

As propostas de flexibilização dos precatórios são contestadas por analistas por, entre outros motivos, representarem um drible no teto de gastos e gerarem possíveis prejuízos a quem tem valores a receber (os chamados credores).

O novo texto em debate, que antes estava sendo discutido com o Judiciário, também pode criar uma bola de neve nos passivos do Tesouro Nacional. Apesar de abrir uma folga no Orçamento de 2022, as pendências se acumulariam ao longo do tempo, já que as dívidas não pagas seriam jogadas para os anos seguintes –quando naturalmente surgirão novas dívidas.

Nas contas da Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados, por exemplo, a fila de pagamentos pode chegar a R$ 1,4 trilhão em 2036.

O presidente da Comissão Especial de Precatórios do Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Eduardo Gouvêa, é contrário ao adiamento dos pagamentos para 2023.

“O melhor seria retirar tudo [do teto], já que precatório não é gasto, e sim dívida, mas já é um avanço. A melhor forma de se chegar a uma solução é mesmo o diálogo entre os Poderes e com a participação da sociedade. Mas temos de esperar pelo texto final, que não pode incluir prorrogação de pagamentos para 2023, o que seria inconstitucional, ou imposições aos credores”, afirmou.


Fonte: Folha de São Paulo

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