Governo Lula estuda taxar big techs dos EUA por três caminhos diferentes; saiba quais
BRASÍLIA — A taxação das big techs, mencionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tinha sido colocada na gaveta com a posse do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em janeiro, voltou à tona por, ao menos, três caminhos.
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Lula afirmou nesta quinta-feira, 17, que o Brasil não cederá à pressão da Casa Branca para aliviar a regulação e a tributação das plataformas de redes sociais no País. “Vamos cobrar imposto das empresas americanas digitais”, disse o presidente em resposta ao ataque tarifário de Trump. O presidente dos EUA se queixou, em carta enviada ao presidente brasileiro, das ordens judiciais contra as plataformas.
Em pronunciamento em rede nacional na noite desta quinta-feira, 17, Lula reforçou esse posicionamento. “A defesa da nossa soberania também se aplica à atuação das plataformas digitais estrangeiras no Brasil. Para operar no nosso País, todas as empresas nacionais e estrangeiras são obrigadas a cumprir as regras.”
Opções na mesa
Entre as opções prioritárias cogitadas pelo Palácio do Planalto e pelo Ministério da Fazenda estão a de implementar um imposto sobre serviços digitais tal como o aplicado em diversos países. O Canadá é mencionado por membros do governo como um exemplo a ser seguido.
A lei canadense exige que grandes empresas nacionais e estrangeiras paguem impostos sobre determinadas receitas obtidas com o relacionamento com usuários online no Canadá, desde que atendam a determinadas condições. As empresas afetadas precisam apresentar uma declaração de Imposto de Renda.
O imposto canadense aplica uma alíquota de 3% sobre a receita obtida com serviços digitais como aqueles que dependem de engajamento, dados e contribuições de conteúdo de usuários canadenses, e certas vendas ou licenciamento de dados de usuários canadenses.
Já a receita de serviços digitais, no caso canadense, é aquela obtida com serviços de marketplace online, serviços de publicidade online, serviços de mídia social e algumas vendas de dados de usuários.
Outra opção no radar do governo Lula é uma taxação via Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide). Trata-se de um tributo que tem uma finalidade específica de intervenção na economia, e é não apenas arrecadatório. A receita é de competência exclusiva da União e tem finalidade pré-estabelecida, como a Cide-combustíveis, cuja arrecadação deve ser aplicada em gastos com infraestrutura de transporte.
Correndo por fora está a aposta do governo no Pilar 1 da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) — mas que é inviável sem um acordo global.
A proposta, discutida internacionalmente, trata do direito de tributação dos lucros no país-sede por países terceiros que façam parte do mercado consumidor das empresas, mas que atualmente não são tributados por eles. É o caso das plataformas digitais.
Essas alternativas vinham sendo discutidas pelo governo Lula desde 2023, num sentido “regulatório, e não retaliatório”, definiu uma pessoa envolvida na discussão ao Estadão. Mas a posse de Trump, em que estiveram presentes os líderes de grandes empresas de tecnologia dos Estados Unidos, como Meta, Google, Amazon e X, levou as autoridades brasileiras a deixar o projeto em banho-maria, para “não cutucar a onça com vara curta”.
Na mira da artilharia
O caso canadense mostra que taxar as plataformas protegidas por Trump pode levar o Brasil à mira da artilharia montada pela Casa Branca.
Após pressão americana, o ministro das Finanças do Canadá anunciou, no fim de junho, que o país vai suspender o imposto sobre serviços digitais “em antecipação a um acordo comercial abrangente e mutuamente benéfico” com os Estados Unidos. “Em consonância com essa ação, o Primeiro-Ministro Carney e o Presidente Trump concordaram que as partes retomarão as negociações com o objetivo de chegar a um acordo até 21 de julho de 2025”, diz o governo canadense.
Enquanto isso, o Palácio do Planalto tem prontos dois projetos de lei para regular as plataformas digitais. Os textos receberam aval no fim de abril, mas a cúpula do governo não chegou a uma decisão sobre qual o melhor momento político para enviá-los ao Congresso.
Um dos projetos foi construído pela Secretaria de Direitos Digitais (Sedigi), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), e o outro, pela Secretaria de Reformas Econômicas (SRE), no Ministério da Fazenda.
A proposta da secretaria da Justiça é uma espécie de Código de Defesa do Consumidor para usuários na internet. O texto propõe medidas de mitigação de riscos de acordo com o serviço digital oferecido e se volta mais ao direito do consumidor do que à punição às plataformas. Visa, por exemplo, dar maior transparência às informações aos usuários de redes sociais, como termos de uso e identificação de publicidade.
O projeto pensado pela Fazenda, por sua vez, mira o mercado das plataformas de redes sociais e trata de aspectos concorrenciais. O texto amplia sobretudo o poder do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para investigar, moderar e definir novas obrigações para as empresas. A ideia é combater, por exemplo, eventuais monopólios na oferta de serviços, anúncios ou buscas e outras formas de abuso de poder em razão da prevalência dessas grandes empresas no acesso aos usuários de internet.
Fonte: Estadão